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A exposição “Unsettling Affairs”, a decorrer na Galeria do Colégio das Artes, em Coimbra, constitui-se, até à data, como a mais vasta apresentação individual de Rui Calçada Bastos no contexto nacional. De carácter antológico, a exposição apresenta um conjunto de obras inéditas resultantes da sua mais recente produção, em articulação com uma selecção de obras pré-existentes.
Tomando de empréstimo o título de uma nova obra de carácter performativo que ocupa toda a área de uma das quatro salas da galeria do Colégio das Artes, a exposição propõe-se como um momento de reflexão sobre um núcleo de trabalhos disciplinarmente distintos que partilham entre si um conjunto de preocupações em torno da inquietude e das suas manifestações.
Mantendo-se fiel ao seu fascínio pelo quotidiano e pelos acontecimentos e incidentes vulgarmente invisíveis que têm lugar nos contextos urbanos por onde circula ou (diríamos) deambula, o artista apresenta um conjunto de imagens fotográficas de grandes dimensões (parte da série “Untitled” que tem vindo a desenvolver desde 2016) e cujo carácter diarístico reforça a obsessão e a infinita curiosidade que denota o seu olhar.
A articulação destas imagens com obras escultóricas (com um carácter mais instalativo) é particularmente pertinente. Dessa experiência de encontro do olhar, em deriva, com os acasos e incidentes que lhe são exteriores, surgem no atelier formas tridimensionais que testam relações improváveis.
Recuperando e fazendo eco, tanto da tradição da escultura minimalista quanto da apropriação dadaísta de objectos encontrados, o artista constrói momentos de tensão, pondo em evidência as questões que tradicionalmente associamos à relação que temos com a escultura – peso, equilíbrio, matéria, corpo, imobilidade ou dinâmica.
A inquietude, de que falámos inicialmente, é particularmente presente na performance “Unsettling Affairs” e num conjunto de pequenas obras que dela derivam. A partir da referência directa à “carta” enquanto ferramenta de comunicação – que sublinha a distância mas aproxima a memória e estimula a imaginação – reconhecemos a presença de uma ideia de deslocação continuada, de ausência, de viajem como processo de conhecimento mas também de desenraizamento, de busca pelo Outro, numa construção idealizada.
Rui Calçada Bastos assume, como poucos, uma herança do romantismo que lhe permite abraçar metodologias conceptuais baseadas no sujeito e nas suas experiências, na valorização da subjectividade, das manifestações emocionais e da intuição, enquanto portas de acesso ao mundo.
O conjunto total de obras expostas aponta para uma inevitável linha de continuidade naquilo que reconhecemos como um percurso marcado pela coerência e coesão, em muito devedoras da relação profundamente íntima que estabelece entre si e o seu trabalho.

Ana Anacleto
Setembro 2019